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A pergunta acima rondou por muito tempo os pensamentos do professor, doutorando e youtuber Rodrigo Diesel, de Curitiba. A resposta para os questionamentos vieram só em 2021, quando, aos 30 anos de idade, ele recebeu o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA). Assista acima.
O termo “neurodivergente”, mencionado por Diesel, é como algumas pessoas que estão no espectro se referenciam para promover a inclusão entre os que têm diferenças neurológicas.
“Eu estou aprendendo quem eu sou e quem eu criei para ser aceito na sociedade, porque conforme a gente vai crescendo, a gente imita os outros para ser mais aceito. Acabamos deixando de ser quem somos para nos encaixarmos em um padrão. A vida inteira eu passei anulando meu lado autista, mas agora eu estou redescobrindo ele e finalmente podendo ser livre”.
Diesel é doutorando em tecnologia e sociedade pela UTFPR — Foto: Arquivo pessoal
Até o início de abril, segundo o Governo do Estado, o Paraná tinha 3.434 pessoas com a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea).
Porém, o número de pessoas no espectro no estado pode ser muito maior. Segundo o Observatório do Autista, estima-se que uma a cada 44 crianças no mundo estejam no espectro.
O professor contou que ao longo da vida recebeu diagnósticos isolados para diversos comportamentos que apresentava. A partir destas análises, ele descobriu que tinha, por exemplo, fobia social, Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e alta sensibilidade a estímulos sensoriais como sons, gostos. Mas Diesel sabia que existia algo além.
Na pandemia, alguns traumas voltaram à tona e ele resolveu procurar ajuda para investigar mais fundo os próprios comportamentos.
“Eu fui a um neurologista, que, com o todo o cuidado do mundo, resolveu fazer uma investigação para ver se eu sou autista ou não. Porque existia uma suspeita. Ele fez diversas entrevistas comigo e, também, com a minha mãe para saber como eu era na infância. Muitas caraterísticas do TEA são mais visíveis na infância, então, quando a gente fica adulto, o diagnóstico é muito mais difícil”.
Rodrigo Diesel tem 30 anos — Foto: Arquivo pessoal
De acordo com o médico Eduardo Cassanho de Oliveira, coordenador Ambulatório Encantar da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba, o diagnóstico precoce para pessoas com TEA é imprescindível.
“É de suma importância para que os cuidados específicos e as intervenções sejam feitas o quanto antes, minimizando as dificuldades que a pessoa possa vir a desenvolver nas áreas da comunicação, interação, no comportamento e na aprendizagem decorrentes do quadro de autismo”.
Pelas peculiaridades que envolvem os diagnósticos em adultos, muitas vezes, é necessário consultar mais de um profissional para fazer a descoberta. Foi o caso de Diesel.
“Primeiro eu fui a uma psiquiatra. E ela chegou a falar pra mim que eu não era autista porque eu fazia contato visual”.
A Organização Mundial da saúde (OMS) define o TEA como uma condição do neurodesenvolvimento que afeta as habilidades de comunicação social e os padrões de comportamento em níveis diferentes.
No caso de Diesel, conforme via comportamentos tidos como diferentes se manifestarem, ele enfrentava comentários que, muitas vezes, o enquadraram como “fresco” ou birrento.
Desde a infância, Diesel recebeu diagnósticos isolados para outras condições que refletem o autismo — Foto: Arquivo pessoal
“Eu acredito que se eu tivesse tido o diagnóstico cedo, o tato para trabalhar com os parentes, professores, seria muito melhor. Por ter sido um bom aluno, a minha parte de interação social foi meio negligenciada, porque normalmente a gente costuma se preocupar com a criança que não vai bem no quesito de notas. Mas quando a criança não tem amiguinhos, sofre bullying… É um tema muito recente que vem sendo trabalhado, nos anos 1990 era muito difícil”.
Com tantas particularidades em si, ele questionou, por anos, se os comentários que ouviu não estavam certos.
“Eu me perguntava: ‘Será que eu não faço por que eu não tenho vontade? Será que eu não como por que eu sou fresco?’. Isso mexe na cabeça. Minha autoestima foi muito afetada com isso. Eu tenho muito problema de aceitação, de culpa, por ser quem eu sou. Até por isso que a gente aprende a mascarar várias coisas, porque a sociedade não quer que você tenha outro padrão de comportamento”.
O médico Eduardo Cassanho explicou que, em caso de adultos com TEA, os sinais podem se manifestar de maneiras muito sutis.
“Adultos com autismo leve podem ter dificuldade de entender algumas situações de ironia, piadas com sentido duplo ou algumas metáforas e, por isso, podem parecer ingênuas ou ‘fáceis de enganar’, pois podem acreditar em situações absurdas para a realidade”.
Outras características descritas por Cassanho, e que também foram sentidas por Diesel, são:
Quando recebeu o diagnóstico, em julho de 2021, Diesel disse que se sentiu aliviado porque, na cabeça dele, tudo começou a fazer sentido. Saber que está no TEA deu forças para que ele, por exemplo, abrace comportamentos que muitas vezes foram rejeitados.
“Quando eu estou com alguma crise sensorial, por exemplo, eu não seguro pra mim, eu sinto ela […] Eu não me prendo mais quando eu quero balançar os braços e as pernas, por exemplo, que eu aprendi a tentar camuflar esses comportamentos porque eu não queria ser chamado de estranho e outras palavras bem pesadas”.
A palavra que na infância e adolescência muitas pessoas usaram para agredi-lo verbalmente, Diesel ressignificou.
“Sempre me chamaram de autista de maneira pejorativa quando eu criança. E hoje eu sou adulto e falo ‘Sou autista mesmo e com orgulho’. É quem eu sou. Faz parte da minha vida”.